sábado, 5 de setembro de 2009
Algumas palavras sobre as Revoluções Burguesas
O estudo das diversas Revoluções - Americana, Francesa, Mexicana, Russa e Chinesa deve encontrar-se em nossos roteiros de estudo para a História Mundial Contemporânea. São assuntos cuja persistência nos últimos concursos demonstram o seu peso. Desconhecê-los é "morte certa"...
Há algum tempo, elaborei para alunos de um Curso de História Moderna este paper. Talvez seja útil antes de iniciar o estudo factual dessas Revoluções. É interessante ressaltar que mesmo as revoluções nas quais o processo revolucionário foi radicalizado e aprofundado, levando sociedades à via comunista (nomeadamente a Russa e a Chinesa), conheceram suas fases burguesas. Espero que ajude. Um grande abraço a todos. Antonio.
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A Revolução Francesa, uma Revolução Burguesa.
Antonio Carlos Figueiredo
O que são as revoluções burguesas?
Em termos esquemáticos podemos dizer que revoluções burguesas seriam eventos históricos nos quais a burguesia se constituiu, senão como a protagonista, pelo menos como a beneficiária do processo que abriu caminho ao capitalismo, transformando, no Ocidente, a sociedade de aristocrática e feudal em burguesa e capitalista.
Mas um fator que chama atenção quando se analisa o processo revolucionário de uma revolução dita burguesa, é o comportamento “pouco revolucionário” da burguesia, antes e durante esse processo. Ao contrário do que seria lógico supor, nos momentos cruciais dos processos revolucionários, não foi a burguesia que conduziu tais processos à vitória. Se tomarmos como base a Revolução Inglesa do Século XVII, encontramos a alta burguesia aliada com a pequena nobreza, contra o rei, mas não desejando, e isto valia principalmente para os grandes chefes presbiterianos, uma vitória absoluta, no que pretendiam manter a monarquia como uma forma de controle sobre as demandas do povo; povo do qual a burguesia precisava e ao mesmo tempo temia. O “novo exército modelo”, com sua carreira aberta ao talento iria conquistar a vitória militar contra as forças realistas, não obstante trouxesse com suas demandas, que eram as demandas de camponeses e artesãos, a conjuntura de uma revolução social, quando os levellers londrinos entrassem em contato com a agitação do Exército.
Numa perspectiva teórica, toda classe revolucionária é revolucionária por ser capaz de elaborar e por em prática um projeto social novo, trazendo em seu bojo a possibilidade de realização de uma nova sociedade. No caso da burguesia, o liberalismo, produzido pelos filósofos iluministas seria o projeto, e a instauração da sociedade burguesa e capitalista, a realização. Mas o fato de uma classe revolucionária trazer em si a possibilidade de realizar uma nova sociedade não implica que esta realização esteja automática e inevitavelmente garantida. Para que uma revolução venha a ocorrer, é necessário que se crie todo um conjunto de circunstâncias excepcionais, ou seja, uma situação de crise revolucionária.
O que seria uma crise revolucionária ?
Tanto historiadores, quanto cientistas sociais reconhecem que para a existência de uma situação de crise revolucionária tem de haver uma falta de harmonia entre o sistema social e o sistema político, situação à qual Chalmers Johnson chamou de disfunção, palavra derivada do modelo de equilíbrio estrutural –funcionalista dos sociólogos. A disfunção seria o resultado de algum processo novo e em desenvolvimento, em consequência do qual determinados subsistemas sociais se encontram numa condição de privação relativa. Assim, um rápido crescimento econômico, uma conquista imperial, novas crenças metafísicas e mudanças tecnológicas importantes seriam, nessa ordem, os quatro fatores que interviriam com mais frequência. Se a disfunção for um processo lento ou suficientemente moderado, é possível que não atinja níveis perigosos.
O segundo elemento vital na criação de uma situação de crise revolucionária é determinado pela posição e atitude defensiva da elite. Se a elite não se adapta à nova situação de disfunção com suficiente rapidez e habilidade que lhe permita atravessar a tempestade e conservar a confiança popular, ela poderá perder a sua capacidade de manipulação e/ou a sua superioridade militar, ou a confiança em si mesma, ou sua coesão; pode ainda separar-se dos que dela não fazem parte, ou sucumbir a uma crise financeira; pode ser ainda, incompetente, fraca ou brutal. O que resulta ser fatal é a combinação destes erros com a intransigência, quando a elite não consegue antecipar a necessidade de reforma, bloqueando todo meio pacífico e constitucional de ajustamento social, fazendo os elementos que sofrem privação, unir-se numa única oposição contra ela.
A burguesia e as classes populares frente ao processo revolucionário
Costuma-se aceitar que na instauração da sociedade capitalista, a burguesia não se comportou e não lutou como uma classe revolucionária na derrubada da antiga ordem, e havendo sido derrubada a antiga ordem, o comportamento da burguesia teria sido mais reformista do que revolucionário, fazendo com que seja aceito que a instauração da sociedade capitalista e burguesa deva ser creditada mais aos efeitos de correntes de forças desencadeadas pela revolução industrial e à ação política revolucionária das classes populares, do que à burguesia. Assim, a construção da nova ordem teria sido resultado também da ação das classes populares urbanas e rurais, em suas lutas, tanto para defender suas antigas condições de vida, face às transformações em curso, quanto para reivindicar participação no novo sistema de poder.
Haveriam dois tipos de revoluções burguesas, sendo a primeira, de tipo passivo ou pelo alto, de caráter reacionário, pois a burguesia chega ao poder sem derrubar a classe e o Estado dominantes, mas fazendo um arranjo político com elas, a burguesia não assume a direção da sociedade, mas assegura a realização de suas exigências econômicas e as antigas instituições sofrem apenas uma modernização.
Neste sentido, a revolução francesa é considerada uma revolução burguesa ativa, a única verdadeiramente revolucionária, o que não se deu pelo fato da burguesia francesa ser diferente das demais, mas pela conjuntura social da revolução francesa, que permitiu a colocação progressiva na cena política das massas rurais e depois urbanas, no que se torna possível propor o esquema explicativo de uma revolução burguesa com sustentação popular, o que constituiria a originalidade do caminho revolucionário francês, num modelo em que se juntam as revoluções burguesa, urbana e camponesa.
Quanto a uma formulação de hipóteses sobre as etapas sociais de uma Revolução, um interessante estudo foi realizado por Crane Brinton que embora tivesse pensado em especial na Revolução Francesa, estendeu sua problematização para outras Revoluções ocorridas no Ocidente. Crane Brinton entendeu então a primeira fase da Revolução dominada por elementos burgueses e moderados, após o que ocorreria a sua substituição pelos radicais, ocorrendo então um reinado do terror; posteriormente haveria uma reação termidoriana para desembocar finalmente com o estabelecimento de uma forte autoridade central sob direção militar, para consolidar os limitados ganhos da Revolução.
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